A pedra de Sísifo
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Eu conheci o Tomás numa quarta-feira no final da tarde. Faltavam 5 minutos pra eu correr pra academia. Eu disse: "espera aí que quando eu voltar a gente conversa". Eu não poderia perder ele de vista e ele sabia disso.
Quarta, quinta e sexta eu já queria sentar com ele em uma mesinha de qualquer Café e contar minha vida inteirinha. Sábado eu já estava implorando por isso, domingo não dava. Segunda, mais ou menos as 19h30 aconteceu.
Não tinha muita gente no Café, eu cheguei antes, queria passar numa loja e aproveitei a ocasião. Eu adorava aquele Café. Sentei confortavelmente, peguei meu livro que estava lendo e pedi um expresso. Eu estava ansiosa mas ao mesmo tempo muito tranquila. Eu li várias páginas até ele aparecer. Quando apareceu, não era exatamente da maneira que lembrava, era melhor ainda e eu adorei colocar os olhos nele. Tomás não falava tanto, mas eu não parei um segundo. Mesmo assim, não foi ruim. Nossas tristezas se encontraram e fizeram sentido. Ele me fez rir de verdade. Ele fez com que eu desejasse parar o tempo naquele momento e eu não sentia isso desde os 13 anos quando namorava com um garoto no colégio e a gente se via diariamente por apenas 30 minutos.
Talvez naquele espaço, muitos casais já tenham se formado, se encontrado, rompido. Mas nenhum deve ter dito sim para o caos do Tomás como eu disse. E eu posso garantir que eu quis dizer.
Semanas anteriores eu tentei sair com algumas pessoas mas havia sido péssimo. Em uma cidade tão grande e não havia ninguém pra me oferecer um peito aconchegante para descansar a cabeça ao final de um dia exaustivo.
Eu não gosto nunca de ninguém e quando gosto, sei que não deveria ter gostado.
Tomás se tornou pai aos 25 em meio a um relacionamento conflituoso. Se casou e se divorciou. Cinco anos depois, está esgotado e apenas sobrevivendo. Ele é sensível e não consegue enxergar como é uma pessoa completa com um mundo de possibilidades pela frente. Ele também não quer gostar de mim. Não tem tempo nem paciência para relações. Não tinha nem uma semana que nossos mundos haviam se tocado e eu já sabia como iria terminar.
Eu já disse isso e vou dizer de novo: cada relacionamento humano é muito genuíno. Cada pessoa é um mundo de possibilidades. Cada pessoa é um mundo completo. Participar de um outro mundo que não seja o seu não é uma ação sem reação. Não é fácil e nem livre de riscos. Você não consegue mergulhar no mar sem se molhar. Você não consegue tocar o mar sem se molhar. Eu sabia que sairia bem molhada porque quis tocar o mar, eu quis mergulhar e explorar tudinho. Mas quis sozinha.
Nossa alma antecede o encontro. Prepara o terreninho. Não que eu quisesse passar os dias lembrando da cara dele quando minha mão se aproximava do seu umbigo, mas eu lembro. A gente nem imagina a quantidade de peculiaridades que um ser humano carrega, mas eu não quero guardar as dele, não mais. Naquele dia que sentei no banquinho da cozinha enquanto Tomás preparava uma bebida eu soube do tamanho da saudade que aquilo causaria em mim.
Se as coisas dependessem de mim nós daríamos certo. Daríamos certo em um final de tarde no sul da ilha, ou no norte, não importa. Ele passaria o braço pelos meus ombros enquanto estivéssemos caminhando lado a lado divagando sobre alguma coisa como sempre. Eu não teria medo em dizer que estava exatamente no lugar onde gostaria de estar e com quem gostaria. Não teria medo em dizer que não entendo nada do que aconteceu, mas é tão confortável descansar no seu abraço que as dúvidas acabam valendo à pena.
Se dependesse de mim eu acabaria com os medos de Tomás e arrancaria a pedra enorme que carrega nos ombros, e então, daríamos certo. Daríamos certo, sim, não porque eu quero mas porque não há outra saída.
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